Fora existe o mundo. Fora, a esplêndida violência
ou os bagos de uva de onde nascem
as raízes minúsculas do sol.
ou os bagos de uva de onde nascem
as raízes minúsculas do sol.
Herberto Helder
Três crianças vivem comigo. A primeira tem um entrançado de silêncio nos cabelos e um vestido que a deixa com frio. A segunda atrai libélulas e outros seres diminutos. Corre juntamente com as folhas quando a terra é levantada pelo vento. A terceira eu nunca vejo bem, porque tem gosto pelo escuro. Elas falam entre si e sabem que descendem da morte e da vida. Existem porque os abismos se rondam e se cruzam. Vejo-as em tempo de chuva, quando se escondem por trás dos móveis e delas escapa luz. Elas brincam com as sombras. Ficam quietas quando ouvem gritos pela casa, o que me fez pensar que talvez entendessem o que eu dizia. Mas não falavam comigo porque não queriam. Depois descobri que não precisam. Meu modo de ser não as interessa. Minhas saídas ao trabalho, o jogo de cartas, os negócios resolvidos no terraço. Nesses momentos, elas dormem ou brincam na cristaleira. Mas quando eu passeio com os cães ou cuido das plantas, elas saltam e somem entre as laranjeiras, brincando com os sentidos e com a natureza. Deixam marcas pela casa, algumas garatujas e redesenhos de mapas. À medida que a presença delas fica mais frequente, começo a perceber que os móveis de minha casa são muito antigos e sem conservação. Os panos cheiram a mofo. Os porta-retratos têm as fotos retiradas. Não há pratos, talheres ou copos sujos em nenhuma hora do dia. Começo a duvidar se meu mundo não é uma lembrança. Grito: vocês me vêem? vocês me vêem? vocês me vêem? A terceira criança sai do escuro e me mostra as raízes minúsculas do sol.
Colagem e Palavras
Luciana Marinho
"...os abismos se rondam e se cruzam."
ResponderExcluir...anúncio de terra firme é encontrá-lo por aqui. beijone!
ExcluirTres niños que, entre sombras, te colman. Y una libélula que te alumbra los días... Esta belleza, ¡tanta belleza!, ¿me dejas que la vista de rojos y amarillos? Luego, te escribo, personalmente, mi bella luciérnaga. Cariños y abrazos en añil.
ResponderExcluiríndigo, querida, não sei por que esse teu comentário estava na caixa de spam, de forma que só o li hoje! e fiquei tocada por tuas palavras. gratíssima! beijo imenso!
ExcluirSim... por vezes o mundo nos parece uma vaga lembrança e a luz de uma vela um majestoso sol!...
ResponderExcluirBeijos,
AL
bem vindo, AL!
ResponderExcluirmundos de (des)encantamento.
beijos
a gente lê por vários motivos: para adquirir conhecimento, para se informar, para se comunicar, etc, etc e tal. mas nada melhor quando a gente lê por prazer e com prazer, fundindo todas as utilidades da palavra escrita num encantamento. tua escrita é um encantamento, luciana. sempre saio daqui enfeitiçado por tuas palavras.
ResponderExcluirbeijo.
que encanto de comentário, celso :)
Excluirencantemo-nos uns com os outros!
muito grata por tua presença aqui.
beijos